Premiações do XIV Congresso Brasileiro de Etnobiologia e Etnoecologia
- SBEE
- 23 de jun.
- 6 min de leitura
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Hoje, iremos passar por alguns dos trabalhos que foram destaque e premiações em nosso XIV Congresso Brasileiro de Etnobiologia e Etnoecologia, que ocorreu entre 14 e 17 de julho de 2024 em Criciúma (Estado de Santa Catarina). A leitura é fluida e um pouco técnica, os textos foram fornecidos pelas próprias autoras e autores dos trabalhos premiados!
Desejamos uma ótima leitura!

Uma luta mais que humana: cosmopolítica dos Povos Tradicionais de Matriz Africana frente ao crime socioambiental da Vale S.A. no Rio Paraopeba - MG
Laura Cristina Martins de Araújo
Orientador: Emmanuel Duarte Almada
Prêmio Científico Darrell Posey
O projeto “Santo Também Luta! Cosmopolíticas dos Povos de Terreiro Atingidos por Barragem”, intitulado no resumo apresentado durante o XIV CBEE Congresso Brasileiro de Etnobiologia e Etnoecologia, como “Uma luta mais que humana: cosmopolítica dos Povos Tradicionais de Matriz Africana frente ao crime socioambiental da Vale S.A. no Rio Paraopeba - MG”, está atualmente renovado com a duração de doze meses, a partir do mês de Abril, considerando a limitação do prazo anterior de dois anos para a execução de todas as atividades propostas no projeto original. Atualmente, o projeto conta com quinze entrevistas realizadas com representantes do PCTRAMA - Povos e Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana, sendo esta articulação o foco da pesquisa, dentro dos seis municípios que a integram e foram impactados, direta ou indiretamente, pelo rompimento da barragem Mina Córrego do Feijão em Brumadinho, MG.
O objetivo geral do “Santo Também Luta!” é desenvolver uma etnografia participante junto à comissão de atingidos por barragens (PCTRAMA), com sede em Betim, a fim de evidenciar alguns conflitos que entendemos serem cosmopolíticos, em que se veem envolvidos amplos coletivos compostos por humanos, mais-que-humanos [santos, nkisis, orixás], e instâncias político-burocráticas como o Governo do Estado de Minas Gerais, Ministério Público de Minas Gerais, a Defensoria Pública de Minas Gerais, Ministério Público Federal e a Vale S.A, todos enredados no conflito e na luta por direitos e reparação socioambiental gerada pelo chamado “Desastre de Brumadinho”. A partir dessa etnografia, pretendemos elucidar de que maneira Orixás, outras Entidades e os próprios povos participam da luta por direitos, como Povos tradicionais e Atingidos.
Academicamente, o projeto propõe o diálogo entre a Antropologia dos Desastres, os Estudos Multiespécies e a Antropologia das Populações Afro-Brasileiras. Além disso, pretendemos trazer à luz, violações dos direitos humanos e da natureza frequentemente silenciados em contextos de desastres sociotécnicos.
A partir do mês de junho daremos continuidade às reuniões de criação do roteiro para a gravação e produção de um documentário previsto no planejamento, que deverá se dar durante os meses finais deste ano, bem como a produção de um mapa participativo com o PCTRAMA, dos territórios afetados pelo desastre. Além disso, será dado continuidade nas entrevistas com integrantes da articulação, bem como a produção de uma cartilha educativa a ser disponibilizada para a sociedade civil.

Fotografias: fornecidas e autorizadas pela autora principal.

Soberania alimentar em áreas de mineração: um problema mundial e local
Graziela Dias Blanco
Orientadora: Natália Hanazaki
“Este estudo foi fruto do meu doutorado e atualmente estou como pós-doc no PPG (Programa de Pós Graduação) em Ecologia da UFSC, onde estou dando continuidade a algumas perguntas do doutorado. Com especial foco na contaminação de espécies alimentícias e medicinais utilizadas por comunidades locais e tradicionais em áreas mineradas. O trabalho é desenvolvido na região carbonífera de Santa Catarina (SC), e eu analiso as espécies da região e seus possíveis impactos na saúde humana. Os principais elementos presentes na região e nos alimentos e plantas medicinais são o cádmio e o chumbo, que estão em concentrações maiores que as indicadas pelas agências de saúde.
As próximas etapas da pesquisa serão comparar as concentrações de elementos-traços e a incidência de doenças encontradas nas comunidades. Assim como realizar um diagnóstico dos impactos advindos dos elementos-traços na região.”

Fotografias: fornecidas e autorizadas pela autora principal.

O elo com o passado biocultural: continuidade no uso de plantas medicinais por povos indígenas Kiriri após sete anos de evento migratório
Rafael Marques Guimarães Konopczyk, Washington Soares Ferreira Júnior, Gustavo Taboada Soldati
Apresentador: Rafael Marques Guimarães Konopczyk
Menção Honrosa
O trabalho apresentado no XIV Congresso Brasileiro de Etnobiologia e Etnoecologia compreendeu uma parte de minha tese de doutorado que apresenta o seguinte título: Migrações de indígenas Kiriri: adoção de estratégias e construção de saberes no contexto de sistemas médicos locais. Na tese, nós estudamos dois eventos migratórios (com idades e locais diferentes) da etnia indígena Kiriri, originária da região sudeste da Bahia (Sertão da Caatinga). Dessa forma, apresentei brevemente os resultados em relação ao padrão de uso de plantas medicinais de uma das comunidades após sete anos de evento migratório[1]. A comunidade partiu do município de Muquém do São Francisco (interior da Bahia na Caatinga) em direção a Caldas (sul de Minas Gerais na Mata Atlântica). O estudo utilizou como unidade de análise traços bioculturais apresentados pela comunidade. Traços bioculturais são reconhecidos como unidades de informação de sistemas socioecológicos (em nosso caso, Sistemas Médicos Locais - SML) que, para o nosso estudo, compreenderam a junção de uma planta acrescido do conhecimento (ou uso) que se faz dela (p. ex., se a hortelã foi indicada para gripe, dores de cabeça e febre, teremos três traços bioculturais). Se o traço biocultural continuou após a migração, consideramos estratégia de manutenção, se houve alteração (ocorrência de doenças ou plantas novas após a migração) estratégia de mudança e, se o uso do traço foi descontinuado (ou abandonado), consideramos conhecimento de estoque. Os traços foram quantificados para cada participante para depois serem processados no programa estatístico R. Como resultado, nós mostramos que nesse tempo de moradia no ambiente novo (no caso, sete anos), embora os indígenas tivessem apresentado novos traços bioculturais (em função da interação com o ambiente), a maioria deles foram do ambiente anterior, além de alguns que foram abandonados (embora o participante tenha lembrado, o uso foi descontinuado). Ou seja, como se tratou de uma migração recente, os indígenas fazem um esforço ou de retornarem ao seu local de origem para buscar plantas de lá e continuarem usando-as da mesma forma, ou de encontrarem essas plantas no local de destino. Como esse tipo de estudo busca verificar o papel da mudança de ambiente nas transformações da estrutura e funcionamento de SMLs, nós recorremos a uma abordagem no âmbito da Evolução Cultural, a qual estuda os mecanismos evolutivos responsáveis pela variação da cultura (no nosso recorte, os traços bioculturais).
Passado o congresso, o estudo apresentou várias atualizações que deixaram a proposta mais interessante (cientificamente falando). Por exemplo, resolvemos pensar em mais variáveis que, embora eu as tivesse coletado, ainda não havia trabalhado nelas. Nesse caso, atualmente, a tese está dividida em dois capítulos: um que aborda os fatores que podem influenciar em estratégias de mudança, manutenção e no conhecimento de estoque; e outro que discute como as pessoas aprendem novos traços bioculturais no local novo, sendo ambas as comunidades contempladas. Contextualizarei brevemente o primeiro capítulo para um maior entendimento do/a leitor/a.
Existe uma vasta literatura científica sobre o tema de migração de grupos humanos e o uso de plantas medicinais, contudo nenhum dos estudos apresenta uma abordagem evolutiva para entender estratégias de mudança, manutenção e o conhecimento de estoque. Nesse sentido, ainda é pouco compreendido como doenças novas e o tempo de moradia podem desencadear mudanças no sistema. Além disso, dois outros aspectos precisam ser mais bem elucidados: se a distância ao local de origem e a possibilidade de os participantes retornarem ao local anterior para buscar plantas pode proporcionar manutenções e se as pessoas conseguem se lembrar de traços bioculturais anteriores (não mais praticados) com a passagem do tempo de moradia. O primeiro capítulo está quase em vias de ser submetido à revista científica enquanto o segundo está na fase de análise dos dados.
Como retorno às comunidades por todo o conhecimento e dedicação que os/as participantes tiveram para o estudo eu me comprometi com eles a escrever um livro que apresentasse algumas características das plantas mencionadas pelos/as participantes. A ideia é apresentar fotos, funções das plantas no sistema médico de cada comunidade e um breve comentário sobre a história biocultural e significados delas para as aldeias pesquisadas.

Fotografias: fornecidas e autorizadas pelo autor principal.
[1] Em tempo cronológico, essa é a segunda migração dos Kiriri que se deu no ano de 2007. A primeira ocorreu no ano de 1988 quando algumas famílias deixaram o local tradicionalmente ocupado pela etnia (sudeste da Bahia), indo em direção a Muquém do São Francisco (interior da Bahia).

Atenciosamente…
Sociedade Brasileira de Etnobiologia e Etnoecologia, Gestão 2024-2026.
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